quinta-feira, 24 de junho de 2010

O feto que queria morrer

- Nascer é pior que morrer. Afirmo isso com minha maturação embrionária quase-plena...
Dizia dentro de outro ser um ser em gestação. Pelo menos sobre a morte pode-se escolher a hora e forma, sobre mim, nada tenho direito: eu não escolhi nascer.

De dentro do útero, quente e cheio de fluido, eu mal podia me movimentar.
O espaço era delimitado e ainda que eu tentasse conhecer o que era minha existência física eu não tinha espaço para experimentar. A maturidade do meu pensamento não é como aí fora: aqui dentro eu já posso ver as coisas como elas são... Ninguém é livre.

Eu podia ver com olhos de outra parte (senão do rosto) que alguma coisa não funcionava bem. A minha única vontade talvez era a de não-existir, e lá fora já me amavam tanto, sem ao menos me conhecer. “É o milagre de criação” – Aquele que duas partes escolhem por uma. Aquele que parte nenhuma escolhe. Isso é lá um milagre?

Se de quando eu fora fecundado o resultado sou eu mesmo (carne-osso), eu não hei de ser milagre. Hei eu de ser um simples eu. Um simples eu e sem-voz, um eu que nem sequer escolheu ser. Porque me apraz tanto amor? Porque mereço assim ser tanto amado?

Vejo bem aquela senhora, que está sempre sentada ali, frente aquela luz que vem de fora... Parece-me cansada da vida, das múltiplas e experiências, redundante sem novas vivências...
Sempre que acaricia a pele que envolve esse ser que me carrega (acreditando acariciar-me também), eu vejo-a sorrir de leve. Seria ser eu a possibilidade de começar de novo? Pobre Senhora! Não lhe apetece a honra de tirar a vida, mas conserva dentro a ilusão de reviver-se em mim...

Nenhum comentário:

Postar um comentário